segunda-feira, 16 de julho de 2007

this is the sound of suburbs (the members)

O curta Rota ABC toma de início uma projeção do filme “São Paulo Sociedade Anônima”, obra fundamental de Luiz Sérgio Person e do Cinema Novo, para introduzir o espectador sobre as expectativas econômicas – leia-se indústrias metalúrgicas e automobilísticas, da região do Grande ABC. Mas é fugindo do óbvio que este documentário chama atenção, mostrando as expectativas dos jovens da região, cada um com um lazer próprio. Lembrando aqui que a situação econômico-social não é o foco, já que é mostrada a partir de um longa.

Um trem passa. O estudante Rafael de 10 anos, filho de operador prensa hidráulica, anda de skate e nos conta sobre suas ‘viagens’ pelo mundo dos quadrinhos. O trem volta. Mau, 25 anos, professor de inglês e filho de torneiro mecânico, fala da primeira experiência com uma bomba de gás lacrimogêneo que, em confronto com a ditadura militar, ficou gravada na memória como o ‘cheiro do ABC’. Começa a música Subúrbio Operário da banda Garotos Podres – principal expoente do movimento punk na região, em que Mau é vocalista. A letra “Nasceu no subúrbio operário / de um país subdesenvolvido” e refrão “sem esperança de uma vida melhor”, seguidos de um compasso pesado com a banda tocando a frente de uma favela, dão o cenário próprio da música. O tem passa novamente. As indústrias queimam produtos químicos. E de novo o trem. Agora é Pipi de 16 anos, filho de soldador e ajudante de pintor de automóveis, que reclama de sua profissão e não quer ter o mesmo futuro do pai, que se esforçou a vida toda para comprar uma casa. É descendo a antiga estrada de Santos com seu rolimã e seus amigos que Pipi se sente o máximo.

Está traçado o panorama da região por três jovens, que fazem de suas atividades válvulas de escape e diversão. O mais novo consegue se entreter sem muitas preocupações, pois ainda é criança, enquanto o adolescente reclama de seu trabalho e não tem uma expectativa pro futuro, o adulto já está desiludido com sua vida e através de uma banda punk (um estilo que é a cara dos subúrbios) protesta em canções politizadas. Os trens são símbolos da industrialização e do meio de transporte para os pobres, onde os filhos de operários têm suas histórias ligadas através dos trilhos. Ganhador do prêmio de melhor curta no festival de Brasília em 1991, Rota ABC apresenta um caminho diferente para conhecer não só a região, como seus impactos sobre os moradores.


(texto pro Kinofórum)

quinta-feira, 28 de junho de 2007

Stroszek / 1977 / Werner Herzog

Stroszek é um filme que pode ser resumido assim: mesmo que você mude de lugar, seus problemas voltam, de outras formas, mas voltam. Bruno Stroszek, uma pessoa afável que acabou de sair da cadeia, é apaixonado pela prostituta Eva. Bruno é perseguido e oprimido pelos cafetões de Eva, por apenas ter oferecido a ela sua casa para dormir. Seu bom vizinho Mr. Scheitz, que cuidou da casa no período em que Bruno esteve preso, preocupa-se com a situação mais e mais perigosa que o amigo se meteu, por tentar cuidar de Eva, que aparece com um olho roxo em sua casa, agora, revirada. Os três decidem então partir, buscar um novo lugar para começar a vida. Estados Unidos é o país escolhido.

Mas Bruno, que não fala inglês, logo se sente desolado com a american way of life e passa a reclamar sua infelicidade a Eva que, através de um peça de madeira, tenta mostrar seu sofrimento e ela, que voltou a fazer programas no restaurante onde é garçonete, não suporta-o e quer dormir separada de Bruno. Logo, Bruno descobre que Eva voltou à prostituição, e esta simplesmente manda-o embora. Bruno aceita, e logo vemos que nada mudou em relação a sua situação na Alemanha, pois Bruno fora perseguido e humilhado por criminosos em seu país, agora, é perseguido pelo banco que cobra sua dívida de empréstimo e humilhado por Eva. Na cena em que sua casa é leiloada e toda a vizinhança se reúne para acompanhar, inclusive as crianças dos casais, Herzog quer mostrar a indiferença do povo americano com relação ao próximo, em que a desgraça do vizinho, é entretenimento para os outros.

Assim como Bruno, Mr. Scheitz também se sente deslocado. Enquanto faz experimentações científicas, o americano vai a caça e assiste TV. Scheitz é do tempo em que o Serviço Secreto estava na ativa na Alemanha, e ameaça o policial quando leiloam sua casa dizendo “Vocês não podem fazer isso. Vou chamar meus amigos do Serviço Secreto e vocês terão seus dedos queimados”. O que, quando é preso após assaltar uma barbearia à mão armada, pergunta a outro policial: “vocês estão todos juntos nessa?”. Strozek nos leva a conclusão que os alemães não estavam preparados para os Estados Unidos. É como o próprio Bruno diz, comparando a situação com o nazismo, que hoje é diferente, mas tudo acontece de outra forma. A cena final é importantíssima, porque se antes no começo do filme, Bruno fazia música para entreter as pessoas, agora ele se tornou o próprio entretenimento da América. Alguns pontos de vista são parecidos com os de Billy Wilder em Ace In The Hole, filme de 1951 em que um escavador fica preso em uma montanha e todo um carnaval e comércio se formam do lado de fora para acompanhar o resgate.

Três Reis, um único país.


Primeiramente falo aqui de Cartola – Música Para os Olhos. Nada demais, apenas um documentário Globo Filmes. Ele não é daqueles documentários cheios de entrevistas, de época ou de conhecidos. É na verdade uma junção de várias coisas, imagens de filmes como Rio 40 Graus de Nelson Pereira dos Santos, ou Ganga Zumba (onde o sambista faz uma participação, junto com a amada Dona Zica) de Cacá Diegues, imagens do próprio Rio de Janeiro de antigamente que servem mais contextualizar o espectador sobre a cidade e a época em que Cartola viveu. São raras as músicas tocadas pelo próprio mestre Cartola em vídeo. É bonito, mas fraco. Falta conteúdo, como é um documentário feito para TV, possui apenas 80 minutos de rodagem. Uso aqui a frase de alguém muito especial que me disse após a sessão do documentário Botinada – A Origem do Punk no Brasil sua impressão: “Parece que ele juntou um monte de imagem de outras coisas pra fazer isso...”, e é o que eu acho sobre esse “grande” pequeno documentário. O grande só foi atingido pela expectativa que tive em vê-lo, através da propaganda feita por uma produtora de grande porte.





O próximo tive vontade de assisti-lo após o trailer, na mesma sessão em que vi Cartola. Oscar Niemayer – A Vida É um Sopro é obrigatório. Não importa se você não liga para arquitetura – como eu, se não se importa com a história e cultura brasileira, é um documentário belíssimo. Niemayer é um homem vivido. Cheio de histórias para contar, e as faz de um uma forma simples, como sua pessoa é. Um homem inteligente, símbolo da arquitetura mundial. Hoje, com quase 100 anos, retrata suas experiências de um modo descontraído, sempre dando risada, às vezes usando um palavrão, mas de um jeito que cativa os espectadores. Ok, na sessão em que fui só tinha meia dúzia de pessoas, e quase todos eram da terceira idade, mas isso não quer dizer que não cative. Frases como “Fudidos não tem vez” ou “...você nasceu, viveu, morreu e se fudeu. A vida é um sopro...” dão o exemplo que, independente da figura que ele é, Niemayer não deixa de se comportar como uma pessoa simples. Ferreira Gullar, Nelson Pereira dos Santos (de novo), José Saramago, Carlos Heitor Cony e até Eric Hobsbawn fazem depoimentos marcantes, dos momentos em que suas vidas cruzarem com a do arquiteto. Imagens belíssimas captadas através das câmeras nos fazem ver e perceber a magnitude das obras do Niemayer; como, quando e porque elas foram construídas, assim como suas curvas. Sua memória falha com relação à políticos, seu medo de voar de helicóptero, suas longas viagens diárias até Brasília, suas construções na Argélia, são exemplo de alguém que está “casando de falar sobre arquitetura”. Ele, tudo bem. Mas a gente tem mais é que assistir com atenção e ouvir cada detalhe que esse grandioso homem nos fala.




Agora, como dizer em algumas palavras, o que alguém que fora tão letrado e com a sua poesia fez mudanças no Brasil, na música e no modo de viver neste país? Pois é, Vinícius é assim: profundo, despretensioso, amigo e grande, grande poeta. "Quem pagará o enterro e as flores se eu morrer de amores?" Viver de música não fácil, isso todo mundo sabe. Mas e se você não precisa de dinheiro, é alguém da chamada “elite”, trabalha como diplomata e se mete em bares com os amigos para cantar e tocar aquela música que você compôs? Pois é, para Vinícius de Moraes era mais difícil viver com o preconceito da sociedade com relação à sua figura, do que ser ele mesmo, alguém sensível que se embebedava facilmente para se desinibir, falar mais com as pessoas, “ter mais amigos” segundo Toquinho, e ser então, feliz. Vinícius era alguém que se enquadrava na contra-cutlura brasileira. Fazendo a chamada “Bossa Nova” que muitos repudiavam, e “demoraram para engolir” segundo Chico Buarque, não pegava bem ver alguém da alta sociedade cantar por aí com um copo na mão. Mas Vinícius fez o que ele sabia fazer, ser um artista. E Vinícius foi Vinícius. Grande músico, compositor, autor de Chega de Saudade de João Gilberto, trilha sonora do Orfeu Negro de Marcel Camus, que premiado com a Palma de Ouro em Cannes, mostrou Vinícius ao mundo. Histórias emocionantes de Chico Buarque, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gilberto Gil, Miúcha, entre outros grandes nomes da MPB, fazem reconhecer a leveza da história do “homem branco mais negro do Brasil”, alguém de outro mundo, com uma facilidade para ser artista, que veio para não ser esquecido. O documentário não se tornou essencial sobre a vida do sambista, ele deixa um pouco aberto a relação de sua obra com o mundo. Mas é bem feito, o que por esse ponto, podemos ver e interpretarmos da maneira que quisermos, sem muita frescura e dizer no final frases como “então ele era assim e assado?”, não. Mulherengo, sim, poetinha, discordo. Ele é um mito, que em duas horas de programa, são apresentados poemas que na interpretação fraca de Camila Morgado e Ricardo Blat, me fazem questionar se foram chamados para fazer isso por serem “bons” ou por apenas estarem na “moda” do Quem Indica. As músicas estão otimamente interpretadas.

quarta-feira, 27 de junho de 2007

"Eu estive no cinema. Chorei."

frase do célebre Kafka, grande escritor.